Há alguns anos, pedir uma cerveja sem álcool em um bar poderia causar estranhamento. Hoje, é cada vez mais comum ver pessoas brindando com versões 0.0, kombuchas artesanais ou até drinques sofisticados sem uma gota de álcool — e sem perder nada da experiência.
O que antes era um nicho de consumidores fitness ou pessoas com restrições, tornou-se um movimento cultural e econômico que está redesenhando o mercado de bebidas no Brasil.
O novo comportamento de quem quer “brindar melhor”
Vivemos uma era em que saúde e prazer não precisam mais andar em direções opostas.
A busca por bem-estar, equilíbrio e consciência tem levado muitos brasileiros a repensar o consumo de álcool. Pesquisas recentes mostram que mais da metade dos consumidores de bebidas alcoólicas já reduziram a ingestão — e, curiosamente, sem abrir mão do ritual do brinde.
É nesse contexto que surgem expressões como “sober curiosity” (curiosidade sóbria) e “mindful drinking”, traduzindo um estilo de vida que preza por estar presente e lúcido — mas ainda assim social e descontraído.
Um mercado que ferve (mesmo sem álcool)
Segundo o Anuário das Bebidas Não Alcoólicas 2024, do Ministério da Agricultura (MAPA), o setor brasileiro já movimenta mais de R$ 160 bilhões por ano.
A maior parte ainda é dominada pelos tradicionais refrigerantes e sucos, mas o crescimento mais rápido vem de novos formatos:
Cervejas 0.0 e 0.5%, com volumes de produção que saltaram mais de 200% nos últimos cinco anos;
Kombuchas e bebidas fermentadas funcionais, que saíram de poucos produtores para milhares de registros após a regulamentação em 2019;
Mocktails e “spirits” sem álcool, nova fronteira da coquetelaria e das experiências de bares premium.
Tudo isso impulsionado por um público mais exigente, que lê rótulos, busca ingredientes naturais e se importa com o impacto ambiental do que consome.
Do boteco ao empório gourmet: onde o sem álcool conquista espaço
O avanço não está apenas nos produtos, mas também nos lugares onde eles aparecem.
Hoje, é fácil encontrar cervejas 0.0 em estádios de futebol, restaurantes sofisticados ou até nas gôndolas de atacarejos populares.
As plataformas digitais também viraram aliadas: clubes de assinatura de kombucha e delivery de mocktails prontos são exemplos do novo consumo sob demanda.
Além disso, bares e restaurantes perceberam o potencial: um cardápio que inclui opções sem álcool amplia o público e comunica inclusão — afinal, ninguém fica de fora do brinde.
A geração Z e o efeito cultural do “menos é mais”
Talvez o maior motor dessa transformação seja a geração Z, que vê o consumo de álcool com outros olhos.
Mais preocupada com produtividade, saúde mental e imagem nas redes, essa geração busca alternativas que combinem sabor e propósito.
Para muitos jovens, a bebida ideal é aquela que traz prazer sem consequências no dia seguinte — e o mercado respondeu à altura.
Inovação e desafios no mesmo copo
Por trás do sucesso, há também desafios técnicos e de marketing.
Reproduzir o sabor e a textura de bebidas alcoólicas sem o álcool é uma arte química e sensorial complexa.
Além disso, o preço ainda é um obstáculo: muitos produtos “sem álcool” ou “funcionais” têm custo elevado, o que limita o acesso fora dos grandes centros.
Mesmo assim, a inovação segue borbulhando. Marcas investem em processos mais naturais, embalagens sustentáveis e narrativas de autenticidade.
Ser “zero” nunca foi tão positivo.
Um brinde ao futuro
O mercado de bebidas sem álcool no Brasil reflete um movimento global — e também um novo jeito de celebrar.
Mais do que modismo, trata-se de uma evolução de valores: saúde, consciência, sustentabilidade e inclusão.
Enquanto algumas pessoas bebem menos, outras bebem “melhor”.
E o que antes parecia um paradoxo — festejar sem álcool — agora se revela como o símbolo de uma nova era: a era do brinde consciente.
Referências
Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA). Anuário das Bebidas Não Alcoólicas 2024.
AFABBRA. Cresce o consumo consciente de bebidas sem álcool entre os brasileiros. (2025).
Euromonitor International. Brazil: Non-Alcoholic Drinks Market Report. (2024).
Banco do Nordeste. Revista Cadernos de Estudos Econômicos – Setor de Bebidas. (2023).
ELSA-Brasil. Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto: padrões de consumo alimentar e bebidas.
BHB Food. Cerveja sem álcool cresce mais de 200% no Brasil. (2024).